25 Novembro 2025
Da escola ao impacto global: uma viagem internacional
20 Anos, 20 Histórias
— Impacto global com Tiago Santos
25 Novembro 2025
20 Anos, 20 Histórias
— Impacto global com Tiago Santos
Quando Tiago Santos percorreu pela primeira vez os corredores envidraçados da Fundação Champalimaud (FC), em 2014, já contava com dois anos de experiência em enfermagem, mas nenhuma em urologia ou oncologia. “No fundo, pode dizer-se que comecei aqui um novo capítulo da minha carreira”, admite com um sorriso tímido. De facto, entrar numa unidade quase vazia, sem orientadores de referência, protocolos ou precedentes, faria muita gente recuar. Mas o Tiago não. Para ele, o vazio era um convite: uma tela em branco onde podia pintar o futuro da enfermagem urológica na Fundação Champalimaud.
“Lembro-me do fascínio do primeiro dia: a luz, a ponte de vidro entre os edifícios, os laboratórios iluminados pelo sol”, recorda. Enquanto muitos recém-chegados poderiam sentir-se intimidados pelas salas de espera sem doentes e por uma equipa em construção, o Tiago viu possibilidades. Estava pronto para ser pioneiro. E conseguiu-o: juntamente com a sua equipa, construiu do zero a unidade de enfermagem de urologia que hoje é uma das pedras basilares dos cuidados prestados na FC.
Mas não se tratou apenas de aparecer e fazer o trabalho. O Tiago teve de aprender depressa, adaptar-se constantemente e manter a humildade perante inúmeros desafios. “O maior deles foi chegar sem experiência em urologia e não ter uma pessoa de referência que me orientasse”, explica. “Tive de estudar, inovar e, essencialmente, ensinar-me a mim próprio, e aos outros, como gerir esta unidade de forma eficaz.”
A passagem de enfermeiro em início de carreira a especialista não foi isenta de momentos mais leves. A certa altura, os colegas apelidaram-no de “o enfermeiro dos laços”, depois de um episódio inesquecível com um cateter na uretra, um pouco de gel lubrificante e uma compressa cuidadosamente atada. “Um doente chegou a ligar para a Fundação a perguntar como é que podia voltar a fazer o laço que eu tinha dado antes. A minha colega fartou-se de rir quando ouviu aquilo”, recorda com um sorriso. É uma recordação que mostra como, mesmo nos ambientes médicos mais sérios, o humor pode ser um aliado fundamental.
Para além destas histórias, o trabalho do Tiago tem um impacto global profundo. Ao observar práticas de enfermagem urológica no estrangeiro, percebeu que, enquanto em Portugal não existe reconhecimento formal da especialidade, os colegas europeus ocupam papéis bem estruturados e altamente respeitados nesta área. O desafio, portanto, não era apenas destacar-se a nível nacional, mas também reduzir esta distância. “Trabalhamos para aproximar a nossa realidade ao padrão europeu, apesar de não termos uma especialidade formal em Portugal”, afirma.
Ao longo dos anos, a dedicação do Tiago abriu-lhe portas a nível internacional. Tornou-se o primeiro enfermeiro português membro do Conselho Executivo da European Association of Urology Nurses, um testemunho da sua competência e do elevado padrão de cuidados prestados na FC. A sua unidade tem sido reconhecida pela investigação em enfermagem, vencendo prémios internacionais e servindo de exemplo para outras instituições portuguesas.
O que distingue a Fundação, segundo Tiago, é a sua cultura de liberdade e inovação. “Temos a possibilidade de implementar projetos e experimentar novas abordagens no cuidado ao doente”, explica. “É isso que nos motiva a fazer as coisas de forma diferente todos os dias.” É um ambiente que combina humanismo com ciência médica de vanguarda, garantindo que, à medida que a clínica integra cirurgia robótica, inteligência artificial e realidade virtual, a essência do cuidado, o toque humano, se mantém intacta.
A visão do Tiago para o futuro é ambiciosa. Espera ver, em Portugal, o estabelecimento de consultas lideradas por enfermeiros, onde estes assumam um papel central na gestão dos cuidados e das doenças crónicas. Inspira-se nos colegas internacionais e pretende promover uma colaboração mais estreita entre os enfermeiros portugueses e a comunidade europeia. “O objetivo é demonstrar que a enfermagem deve ser especializada, reconhecida e com impacto, tanto a nível nacional como internacional”, sublinha.
Apesar do reconhecimento global, Tiago mantém-se com os pés bem assentes na terra. Valoriza a união e o espírito de equipa que se vive na FC, descrevendo-o como “‘vestir a camisola’, fazes parte de uma equipa, e isso não mudou apesar do nosso crescimento.” Para ele, a verdadeira recompensa está nas interações diárias com os colegas, doentes e famílias, assim como nas pequenas vitórias diárias.
A história do Tiago lembra-nos que o crescimento surge, muitas vezes, de abraçar o desafio e a incerteza. “No início, não tínhamos nada”, recorda. “Tivemos de construir, aprender e adaptar-nos constantemente. Esse desafio abriu portas a oportunidades que nunca imaginei.”
De um jovem enfermeiro a entrar numa unidade vazia a uma voz respeitada na enfermagem urológica internacional, Tiago, e a sua equipa, provaram que a resiliência, a humildade e até um sentido de humor na altura certa, não são apenas virtudes pessoais, são os alicerces para fazer a diferença, tanto “em casa” como no palco global.
Tiago Santos, Enfermeiro de Urologia, Fundação Champalimaud.
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