29 Novembro 2022

Nem todas as doenças do movimento são iguais, mas o diagnóstico precoce pode ajudar no combate a todas.

A primeira edição do Dia Mundial das Doenças do Movimento acontece hoje (29 de Novembro de 2022) e, embora se fale com frequência de algumas destas doenças, como é o caso da Doença de Parkinson, existem outras menos conhecidas. Além disso, ainda que as diferentes Doenças do Movimento possam ter algumas características em comum, os tratamentos para cada uma delas podem ser muito diferentes.

Nem todas as doenças do movimento são iguais, mas o diagnóstico precoce pode ajudar no combate a todas.

Para assinalar esta data, pedimos a Marcelo Mendonça, neurologista e investigador da Unidade de Neuropsiquiatria e do Laboratório de Disfunções dos Circuitos Neurais na Fundação Champalimaud, que desse uma visão global das Doenças do Movimento, seus sintomas, diagnóstico e tratamentos.

O que é exatamente uma Doença do Movimento?

As Doenças do Movimento são um grupo de doenças neurológicas caracterizadas por movimentos anormais ou alterações dos movimentos. Existem várias Doenças do Movimento, sendo que as mais frequentes são a Doença de Parkinson e o tremor essencial (uma causa comum e frequente de tremor que acontece durante a execução de um movimento - p.ex ao beber um copo de água). No entanto, existe um vasto número de outras condições como a distonia, a ataxia, a coreia, a doença de Huntington, as discinesias e os tiques que têm tratamentos específicos.

Reconhecer e aumentar a informação sobre estas doenças menos comuns pode não apenas melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem com elas, mas também reduzir o estigma associado à presença de alterações dos movimentos ou de alterações comportamentais.

É verdade que pessoas com sintomas levam geralmente algum tempo até consultarem um médico? O que as impede de procurar ajuda?

Muitas pessoas com Doenças do Movimento sofrem em silêncio por vários motivos. Os sintomas podem piorar muito gradualmente, de uma forma em que são dificilmente percebidos. Ou então a pessoa não valoriza os sintomas enquanto não sente muito desconforto e opta por não incomodar o médico. Os dados demonstram que, para Doenças do Movimento menos comuns, é frequente um atraso no diagnóstico (por exemplo, até 5 anos para a distonia cervical). Há também algumas pessoas que temem descobrir que têm alguma doença neurológica grave e adiam a consulta com um especialista.

Seja qual for o motivo, uma das principais mensagens que o Dia Mundial das Doenças do Movimento procura transmitir é a importância de obter um diagnóstico precoce e preciso, além de aumentar a informação das pessoas para o facto de poder existir ajuda para os seus sintomas.

Por que o diagnóstico precoce é tão importante?

Um diagnóstico precoce de uma Doença do Movimento pode ter um impacto na sua qualidade de vida: o diagnóstico pode ajudar a entender não apenas os sintomas motores, mas também outros sintomas não motores mais subtis que podem estar presentes. O diagnóstico precoce pode levar a um tratamento mais precoce e a uma melhor qualidade de vida e bem-estar. Simplesmente dar um nome aos sintomas e oferecer apoio emocional podem permitir a seleção de estratégias eficazes para a aceitação e permitir que as pessoas se adaptem mais prontamente à doença.

O tratamento precoce pode ainda proporcionar melhor qualidade de vida por um período de tempo mais longo. Por exemplo, tremer não significa necessariamente que se tenha Doença de Parkinson ou qualquer outra Doença do Movimento. A presença de um tremor, um tique, alguma lentidão, cãibras ou uma rigidez que vai e vem, e que não esteja associada a outros sintomas ou a algum impacto no dia-a-dia provavelmente não se refere a um caso de uma doença do movimento. No entanto, se os sintomas forem recorrentes, ou se acontecer um aumento rápido na lentidão ou nas contrações musculares, ou se começarem a surgir problemas durante as refeições devido ao tremor, é importante discutir isso com um médico o quanto antes.

Grande parte do medo em torno das Doenças do Movimento vem da concepção de que são incuráveis ​​ou mesmo intratáveis, mesmo com o diagnóstico precoce. Até que ponto isso é verdade e que opções de tratamento existem?

Atualmente temos várias ferramentas úteis para o diagnóstico e tratamento das Doenças do Movimento. Existe uma variedade de medicamentos que, combinados com fisioterapia e exercício, são bastante eficazes no controlo dos sintomas e ajudam as pessoas a manter e até melhorar a qualidade de vida. Mesmo quando a medicação não é suficiente para o controlo dos sintomas, existem várias opções - da toxina botulínica à estimulação cerebral profunda ou ultrassom focalizado - que podem melhorar drasticamente o bem-estar. Há estudos a decorrer sobre terapias modificadoras de doenças aplicadas às Doenças do Movimento. Por exemplo, com o objetivo de reduzir a taxa de progressão da Doença de Parkinson, estão a ser testados promissores novos agentes dirigidos contra alvos moleculares que se sabe estarem disfuncionais nesta doença.

Dada a diversidade de Doenças do Movimento, quais são as perguntas que a equipa da Fundação Champalimaud está particularmente interessada em responder?

As Doenças do Movimento são um campo desafiante. Do ponto de vista clínico, os sintomas apresentados podem fazer parte de múltiplas doenças, o que complica o diagnóstico e o tratamento: o tremor pode ser um sintoma da Doença de Parkinson, tremor essencial, distonia ou outras doenças. Ao mesmo tempo, diferentes doenças podem ter fenótipos (sintomas) semelhantes. Por exemplo, os sintomas de Atrofia Multissistémica ou da Paralisia Supranuclear Progressiva podem manifestar-se de maneira muito semelhante à Doença de Parkinson.

Como investigador, ainda existem várias questões em aberto sobre quais são as disfunções dos circuitos cerebrais que estão na base dos sintomas: por que há um dificuldade na iniciação da marcha espontânea na Doença de Parkinson? Por que há posturas anormais dos membros na distonia? Por que as doenças de tiques se apresentam com tanta frequência com sintomas obsessivo-compulsivos ou de atenção?

Na Fundação Champalimaud, temos um ambiente/um contexto onde o conhecimento atual dos circuitos cerebrais pode ajudar-nos a resolver algumas destas questões clínicas e a trabalhar em projetos centrados na resolução de sintomas. A existência de equipas compostas por médicos e investigadores que trabalham juntos - e com isto refiro-me tanto a médicos que fazem investigação como investigadores que trabalham na clínica - permite-nos abordar tanto sintomas motores e não motores com uma perspectiva partilhada de disfunção de circuitos cerebrais. Tudo isto acontece ao mesmo tempo que é assegurado um atendimento clínico correspondente ao estado-da-arte neste domínio.

Texto de John Lee, Content Developer da Equipa de Comunicação, Eventos & Outreach da Fundação Champalimaud.
Traduzido por Catarina Ramos, Co-Coordenadora da Equipa de Comunicação, Eventos & Outreach da Fundação Champalimaud.
Nem todas as doenças do movimento são iguais, mas o diagnóstico precoce pode ajudar no combate a todas.
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